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Tribuna Imprensa Regional

2022/07/08

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EDITORIAL – Letícia Pinto

Editorial Última Hora

08 de Julho de 2021 Com a guerra na Ucrânia, a instabilidade das cadeias de produção, a inflação e o consequente aumento das taxas de juro, tudo aponta para um horizonte duro na Europa. Infelizmente, as expectativas de uma recuperação robusta no rescaldo da pandemia passaram a ser mera miragem. Neste contexto, é com particular apreensão que se recebem as declarações de Christian Lindner, ministro das Finanças alemão. Há dias, o líder do Partido Liberal da Alemanha anunciou a intenção de cumprir o (autoimposto) travão da dívida pública já em 2023. Para tal, propõe cortes na despesa pública para impor disciplina orçamental e, nas palavras do próprio, enviar “um sinal para o Banco Central Europeu”. O BCE não precisa desse sinal. Está a acompanhar a evolução da inflação, impulsionada essencialmente por fatores externos (o custo da energia), e a adotar as medidas de política monetária que contribuem para a reduzir - terminar os programas de injeção de capital nos mercados e aumentar as taxas de juro de forma progressiva - e avaliando os seus efeitos a cada passo. Se à política monetária mais restritiva do BCE se somarem políticas orçamentais austeras, o resultado inevitável é uma nova recessão, tal como sucedeu durante a crise financeira. Dessa altura, Portugal e outros países da União Europeia guardam amargas memórias. Perante a iminência de se repetirem erros do passado, urge recordar as lições de então, reconhecidas até pelo insuspeito FMI. A austeridade falhou em toda a linha: não equilibrou as contas públicas, aumentou o desemprego, provocou uma recessão, alimentou os populismos. Não funcionou na altura e também não funcionaria agora. Essa resposta teve três fatores marcantes. A adoção, pelo BCE, de uma política monetária expansionista de estímulo à atividade económica. A suspensão, pela Comissão Europeia, das regras orçamentais, permitindo aos governos ultrapassar os limites do défice para apoiar os trabalhadores e as empresas, sem temerem a imposição de sanções. A aprovação, pelo Parlamento Europeu e pelo Conselho, do plano de recuperação, financiado por dívida comum emitida pela UE, algo que até então nunca tinha sucedido. A economia europeia está agora numa situação diferente, pelo que a resposta não deverá ser igual. Mas é bom que não se mate o paciente com a cura. Precisamos, portanto, que os governos tenham margem de manobra para apoiar a economia e evitar uma forte crise económica e social. Para tal, manter suspensas as regras orçamentais europeias é importante. Mas não basta. É preciso repensá-las profundamente, assim como a arquitetura atual da União Económica e Monetária. Criada para uma realidade que já não existe, continua órfã de capacidade orçamental e exposta aos riscos de uma União Bancária incompleta. Este é mais um grande teste à UE. Estaremos à altura, ou recuaremos aos erros de uma década atrás? 08 de Abril de 2021 Entre as muitas imagens que têm marcado estes mais de 40 dias de insanidade bélica, há uma que teima em permanecer gravada na minha cabeça. Aparece numa reportagem televisiva, realizada num centro de acolhimento na fronteira polaca logo nos primeiros dias do conflito. A câmara vai filmando os bens ali reunidos para serem entregues aos refugiados. Alimentos, medicamentos, roupas e cobertores...o habitual naquele contexto. Mas então surge uma secção onde se acumulam apenas brinquedos, pilhas de brinquedos cuidadosamente organizados e arrumados, como numa loja que enfeitou a sua montra para instigar aquele brilho característico nos olhos das crianças. Curiosamente, o que mais impressiona naquela visão não é tanto o seu contraste com tudo o resto, mas o facto de fazer tanto sentido naquele contexto. As crianças que viriam a atravessar, aos milhões, aquela e várias outras fronteiras precisavam de muita coisa. De se alimentarem, de se aquecerem, de receberem cuidados de saúde. Mas acima de tudo precisavam de sentir que, naquele porto seguro, podiam começar a ser novamente iguais a si próprias. Era essa a função daqueles brinquedos: assegurar-lhes que o mundo era mais do que o terror que tinham acabado de conhecer. Cada criança em fuga de um conflito, deste ou de qualquer outro que esteja a desenrolar-se no mundo, merece da nossa parte o mesmo tratamento, a mesma proteção, e as mesmas oportunidades que reservamos para os nossos próprios filhos e netos. Os números da guerra na Ucrânia são a negação desses direitos. Dos perto de quatro milhões de refugiados que já deixaram o país desde o início da invasão russa, cerca de metade estão em idade escolar. Mais de 2,5 milhões de crianças estão ainda deslocadas dentro do país. Muitas mais viram as suas vidas viradas do avesso. As aulas estão interrompidas, ou funcionam apenas online onde tal é possível. Um total de 378 escolas secundárias e universidades foram destruídas ou tornadas inutilizáveis. Mesmo as crianças por nascer já pagam a fatura desta guerra. Cerca de 265 mil mulheres ucranianas estavam grávidas no início do conflito, com perto de 80 mil com parto previsto no prazo de três meses. Entre as que permaneceram no país, a sua segurança e a dos seus filhos é uma incógnita. Infelizmente, já assistimos nesta guerra ao impensável: o bombardeamento de uma maternidade. Este é o saldo de apenas 40 dias de guerra. Cabe-nos a nós, União Europeia, assegurar que não será o balanço das vidas de milhões de crianças e jovens que, mais do que quaisquer outros, estão a sofrer as consequências de algo que nada contribuíram para causar. Garantindo-lhes proteção dentro e fora das fronteiras do seu país. Protegendo-os dos riscos acrescidos de abusos e exploração a que muitos estão sujeitos, em especial as crianças deslocadas sem as famílias e as raparigas. Assegurando-lhes segurança, conforto, acesso à saúde e à educação. E também, dentro do que é humanamente possível, o direito a serem felizes. O direito de serem crianças. 11 de Fevereiro de 2022 Nas próximas semanas é pouco provável que aconteça algo de tão extraordinário que leve muita gente a mudar de voto ou a decidir o que não decidiu até aqui. Ou seja, mesmo acreditando que ainda há muitos indecisos, o mais provável é que acabem por fazer a sua opção com base em informação de que já dispõem. O Presidente da República, que se mostrou muito satisfeito com o nível dos debates, na sua versão de analista, considerou que o nível de esclarecimento é tão grande que os portugueses podem ir votar em massa no dia 23. Marcelo acha que há uma percentagem muito grande de portugueses para quem pouco importa o que vai ser dito e vai acontecer em campanha, pelo menos na última semana. Seja por isso, porque já têm tudo muito claro na cabeça, seja por receio de não poderem deslocar-se à mesa de voto no dia 30 ou não quererem correr o risco de acabarem contagiados, espera-se uma grande adesão ao voto antecipado. O que esses eleitores não vão poder exigir é que se pare a campanha no sábado, dia 22, para poderem refletir, como vai acontecer com os eleitores do domingo seguinte, que não vão ter ninguém a tentar convencê-los à última hora, no sábado, dia 29. Os de dia 23, os do voto antecipado, podem até ir no meio da caravana e fazer um desvio para a mesa de voto. Por aqui se percebe como o dia de reflexão é um anacronismo da nossa democracia. Pode ter feito sentido, quando foi criado, mas é totalmente injustificado num tempo em que é necessário alargar o voto antecipado, fazendo que uns eleitores estejam defendidos de “toda a atividade passível de influenciar, ainda que indiretamente, quanto ao sentido de voto, bem como a exibição, junto das mesas de voto, de símbolos, siglas, sinais, distintivos ou autocolantes de quaisquer listas” e outros sejam parte de tudo o que acontecer em campanha. Basta pensarmos que no primeiro dia de campanha a grande questão foi a brincadeira/ignorância/lapso/gafe de Rio sobre o voto antecipado de Costa, logo transformada em crime de lesa-democracia pelos seus adversários. Na verdade, o líder do PSD precisa de saber que os indecisos dificilmente se convencem com incidentes de campanha, preferindo, talvez, que lhes falem do modo como pretendem fazer deste país um país melhor. Mas o mais certo é que no primeiro dia tenha sido Rui Rio para no dia seguinte ser outro qualquer. Desta forma, os eleitores antecipados devem chegar ao dia 23 com casos e casinhos de campanha em dose suficiente para dispensar o dia de reflexão. 21 de Janeiro de 2021 Nas próximas semanas é pouco provável que aconteça algo de tão extraordinário que leve muita gente a mudar de voto ou a decidir o que não decidiu até aqui. Ou seja, mesmo acreditando que ainda há muitos indecisos, o mais provável é que acabem por fazer a sua opção com base em informação de que já dispõem. O Presidente da República, que se mostrou muito satisfeito com o nível dos debates, na sua versão de analista, considerou que o nível de esclarecimento é tão grande que os portugueses podem ir votar em massa no dia 23. Marcelo acha que há uma percentagem muito grande de portugueses para quem pouco importa o que vai ser dito e vai acontecer em campanha, pelo menos na última semana. Seja por isso, porque já têm tudo muito claro na cabeça, seja por receio de não poderem deslocar-se à mesa de voto no dia 30 ou não quererem correr o risco de acabarem contagiados, espera-se uma grande adesão ao voto antecipado. O que esses eleitores não vão poder exigir é que se pare a campanha no sábado, dia 22, para poderem refletir, como vai acontecer com os eleitores do domingo seguinte, que não vão ter ninguém a tentar convencê-los à última hora, no sábado, dia 29. Os de dia 23, os do voto antecipado, podem até ir no meio da caravana e fazer um desvio para a mesa de voto. Por aqui se percebe como o dia de reflexão é um anacronismo da nossa democracia. Pode ter feito sentido, quando foi criado, mas é totalmente injustificado num tempo em que é necessário alargar o voto antecipado, fazendo que uns eleitores estejam defendidos de “toda a atividade passível de influenciar, ainda que indiretamente, quanto ao sentido de voto, bem como a exibição, junto das mesas de voto, de símbolos, siglas, sinais, distintivos ou autocolantes de quaisquer listas” e outros sejam parte de tudo o que acontecer em campanha. Basta pensarmos que no primeiro dia de campanha a grande questão foi a brincadeira/ignorância/lapso/gafe de Rio sobre o voto antecipado de Costa, logo transformada em crime de lesa-democracia pelos seus adversários. Na verdade, o líder do PSD precisa de saber que os indecisos dificilmente se convencem com incidentes de campanha, preferindo, talvez, que lhes falem do modo como pretendem fazer deste país um país melhor. Mas o mais certo é que no primeiro dia tenha sido Rui Rio para no dia seguinte ser outro qualquer. Desta forma, os eleitores antecipados devem chegar ao dia 23 com casos e casinhos de campanha em dose suficiente para dispensar o dia de reflexão. 17 de Dezembro de 2021 Há 15 anos o Jornal Tribuna Valpacense acompanha o Natal das famílias valpacenses, mirandelenses, flavienses, murcenses e muitas outras, registrando os mais variados tipos de acontecimentos festivos, assim como acidentes e catástrofes. Todos esses eventos registrados pelo Jornal Tribuna Valpacense trouxeram grande apreensão. No entanto, nenhum deles durou tantos meses como a atual pandemia do novo coronavírus. Isoladamente, nenhum deles causou tantos enfermos, tantas mortes, inclusive prematuras; nenhum deles causou desacerto generalizado da economia; nenhum deles, nem mesmo a II Guerra Mundial, causou o alto impacto vivido atualmente pela maioria dos países, ricos ou pobres. Já foi mais fácil desejar Feliz Natal a parentes, amigos e leitores. Fazíamos isso num contexto de alegria geral, de muitas festas, com recessos, férias e viagens já programadas. Natal, viragem de ano, janeiro e, inclusive, carnaval, eram vividos como amplo tempo de lazer. Já fazia parte de nossa rotina, da nossa cultura. Desta feita, não apenas o Natal, mas todos esses festejos, necessariamente, serão substituídos por um tempo de recolhimento, principalmente pelas pessoas prudentes, cuidadosas de si e dos seus. Serão dias e meses de recolhimento. Muitos ainda estarão a atravessar um período de luto em função da perda de entes queridos. Outros ainda estarão assustados com o próprio contágio ou de algum parente. Muitos jovens e adultos verão o início de mais um ano ainda sem a perspectiva consistente de trabalho e renda. Outros estarão a trabalhar muito em função de alguma oportunidade surgida no contexto da pandemia. Um grupo grande de empresários estará a fazer muitas contas na busca de um novo equilíbrio para o próprio negócio numa crise inédita e de grandes proporções. Vivemos, portanto, uma época de recolhimento forçado, análise, planeamento e projeção de dias melhores. A equipa do Jornal Tribuna Valpacense deseja aos assinantes, leitores, anunciantes e amigos que esse tempo seja vivido sob a luz divina que desce sobre nós com o nascimento do Menino Jesus. A luz do Natal ajudar-nos-á a fazer as melhores escolhas, a viver a verdadeira fraternidade e a realizar o bem em todos os aspectos de nossa vida. Outras crises foram vencidas ao longo da história, esta também será. Por enquanto, isolamento social, proteção de si e do próximo, intensa convivência com o núcleo familiar, planos de retomada e FELIZ NATAL. 5 de Novembro de 2021 Haverá espaço para um novo partido que possa estar ao lado do PS? Um partido que não defenda a revolução do proletariado ou os regimes da Coreia do Norte e da Venezuela, como o PCP. E que não odeie, pelo menos na sua retórica (doutrina Robles), a propriedade privada e a iniciativa das empresas, como o Bloco de Esquerda. E que não seja apenas uma nota de rodapé de visão animalista como ainda é o PAN. O PSD, findo que está o CDS, terá, aparentemente, um potencial conforto no liberalismo económico e libertarismo moral da Iniciativa Liberal ou até na negação do Estado de direito com nuances salazaristas do Chega. Sem garantias, é certo. Mas o PS, se vier a ter uma maioria insuficiente para governar sem apoios parlamentares distintos, terá um problema. É certo que não pode dizer desde já, limitando provavelmente a sua votação, que está disponível para um acordo de bloco central com o PSD. Mas que Orçamento do Estado e que acordos políticos se conseguirão entre PS e Bloco e/ou PCP em fevereiro que não se conseguiram em outubro? A esperança do PS é, portanto, a de uma votação que permita governar isolado ou, pelo menos, arrastar necessariamente para um acordo, mesmo que pontual, PCP e Bloco de Esquerda, nem que seja por patriotismo e pragmatismo. Dando por adquirido que o Livre é apenas uma excrescência burguesa e caricatural do Bloco (assim o diria o PC...), sem grande expressão e sem grande seriedade, como se viu nas últimas legislativas e no exercício da última legislatura. Se tal não suceder, um acordo pós-eleitoral com o PSD não funcionaria melhor? Não daria mais previsibilidade para um período extraordinário de investimento público, de recuperação económica e de reacerto da despesa pública? António Costa veio dizer que ou ganha as eleições - leia-se, ou é primeiro-ministro novamente - ou sai de cena, aumentando a pressão. Mas funcionará essa “ameaça”? Sou aliás daquelas a quem não convence, por princípio, uma qualquer ideia de “bloco central”. PS e PSD deveriam ter estruturalmente ideias distintas de Estado e de sociedade. Mas, na verdade, têm também diversos aspetos em comum. Em muitas áreas, as suas propostas são próximas - um bom exemplo é a área da justiça, em que o paralelismo é evidente, ao contrário do que Bloco e PCP propõem, que é basicamente a devoção à agenda sindical e creditícia dos poucos milhares de servidores públicos do setor. O que ficou evidente na incapacidade de se executar qualquer alteração ao que existia de fundamental desde 2015, em confronto com um programa levado a votos. O “reformismo” do Bloco de Esquerda e do PCP, na verdade, colide em boa parte com o do Partido Socialista. O PS defende, e é esse o seu eleitorado, um Estado responsivo e leal, mas numa sociedade aberta aos privados, à livre concorrência e ao mercado, regulada e previsível, que deve fazer bem o que faz, mas que não tem a pretensão de tudo fazer e absorver. Por isso acabou a geringonça: não era possível fingir mais tempo. Mesmo que se repita, noutras declinações futuras, algo terá de mudar nos próximos anos - seja uma cisão no PS, seja a abertura a novos acordos, seja o acentuar da irrelevância eleitoral da extrema-esquerda, que mais evidente ficaria se se alterasse o método eleitoral, que continua a majorar os extremos reduzidos, à direita e à esquerda, em vez da maioria objetiva dos votos. 8 de Outubro de 2021 Tirando o facto de, desta vez, ser exatamente como sempre foi, necessitando de negociações sérias, para que o orçamento seja o compromisso possível entre diferentes formas de ver o país, tirando isso, desta vez, é diferente. Tão diferente que as fontes dos jornalistas estão sempre a dizer-lhes que “desta vez, é diferente”. Desta vez, o governo não pergunta aos seus parceiros de esquerda o que pretendem para aprovar o orçamento, dizem as fontes mais à esquerda. Desta vez, os parceiros não se contentam com um orçamento de esquerda, queixam-se as fontes do governo. Desta vez, os que não perguntam não obtêm respostas e os que não batem à porta não encontram do outro lado ninguém que a abra. É tão inverosímil esta ideia de que, desta vez, o orçamento pode ser chumbado, que se estranha a facilidade com que ela é aceite como sendo o cenário mais provável. Quem poderia estar interessado em eleições que acabariam por deixar tudo pior do que está? Se o governo tem margem para negociar a introdução de algumas medidas exigidas pelo PCP ou pelo Bloco como essenciais, por que razão não o faria? Se o governo mostrar essa disponibilidade, por que razão os parceiros da geringonça não estariam disponíveis para viabilizar o orçamento Entramos numa zona pantanosa, em que já ninguém sabe como sair. Quanto mais vezes o governo repete que já deu muito à esquerda e a esquerda repete que o governo não lhe dá o que ela quer, mais parece igual a nada tudo o que o Executivo ceder. E também sabemos que muitas das medidas que o governo apresenta como cedências à esquerda são medidas já negociadas e anunciadas em orçamentos anteriores. Pode tudo isto ser explicado apenas por cansaço? Não parece. Há claramente uma encenação em curso que servirá ou para tornar mais cara a viabilização do orçamento ou para atribuir culpas em caso de crise política. Quem já se livrou dessa responsabilidade foi a direita, dispensada pelo primeiro-ministro e pelo Presidente da República da obrigação de defender o melhor para o país, no pressuposto de que ter este orçamento aprovado será o melhor para o país, como argumentam Costa e Marcelo. Dispensada a direita, e tendo a esquerda a faca e o queijo na mão, é completamente irracional, do ponto de vista partidário, que a esquerda queira ir a votos sabendo que acabará responsabilizada nas urnas. Estamos claramente a mudar de ciclo político e o que se estranha é esta vertigem que parece estar a levar a esquerda a dar o tal passo em frente, mesmo sabendo que está num equilíbrio muito frágil na berma do precipício. Tanto insistem que acabarão por fazer exatamente o que dizem não desejar, cria-se uma expectativa que, mesmo podendo ser falsa, conduz ao comportamento que a torna verdadeira. Pobre país!   9 de Setembro de 2021 Em Portugal não há uma verdadeira democracia nas autarquias, tornando mais difícil e lento o desenvolvimento do país, por força de uma legislação ultrapassada, que urge corrigir. A filosofia e a estrutura de organização política das autarquias e do governo central são distintas e contraditórias, com consequências graves para o (mau) funcionamento em algumas autarquias. O sistema depende demasiado das características individuais dos autarcas. A nível central, o primeiro-ministro é nomeado pelo Presidente da República, ouvidos os partidos representados na Assembleia da República e tendo em conta os resultados eleitorais (n.º 1, art.º 187 da CRP), permitindo a interessante experiência democrática do governo nacional que ficou conhecido pela ‘geringonça’. Em qualquer momento, e muito bem, uma (nova) maioria dos deputados dispõe de mecanismos constitucionais para impor a mudança de governo. Ora, tal exercício democrático é impossível nas autarquias, onde vigora um estranho presidencialismo centralista. Por Lei, o presidente da câmara (e das juntas de freguesia) não é quem consiga reunir um apoio maioritário entre os eleitores, vereadores ou membros eleitos da Assembleia Municipal (AM), mas sim o primeiro candidato da lista mais votada (art.º 57.º, Lei 169/99), mesmo que esteja em minoria eleitoral, o que é um paradoxo. Ainda que uma ampla maioria de eleitos quisesse designar, na AM, um outro presidente de câmara, a lei não o permite. Nas autarquias não são possíveis ‘geringonças’, o que limita o exercício da democracia a nível local e impõe uma ‘ditadura da minoria’. A inamovibilidade e a impressionante concentração de poderes na pessoa do presidente da câmara (art.ºs 34.º e 35.º, Lei 75/2013) transforma em verdadeiros ditadores autárquicos aqueles que tenham essa predisposição genética. Nem sequer há forma expedita de os obrigar a cumprir a lei. Segundo o n.º 7 do art.º 42.º da Lei 75/2013, o presidente da câmara municipal deve disponibilizar a todos os vereadores os recursos físicos, materiais e humanos necessários ao exercício do respetivo mandato. Esta ausência de condições e meios, por parte de vereadores que continuam a desempenhar as suas profissões, dificulta um dos principais mecanismos de defesa da democracia, o escrutínio apropriado por parte da oposição. A AM deveria exercer uma função fiscalizadora semelhante à da Assembleia da República, porém, os poderes da primeira, como órgão deliberativo, são muito limitados e quase decorativos. A AM não pode introduzir modificações nas opções do plano e na proposta de orçamento que lhe são presentes pelo executivo e o debate é pouco mais do que um curto momento de inconsequente teatro político. Os deputados municipais ou aprovam tudo, ou chumbam tudo, não há outra alternativa (art.º 25.º, Lei 75/2013). Também a sua capacidade de apreciação e fiscalização está muito limitada, com apenas cinco sessões ordinárias anuais, que decorrem com imensas restrições e com a proibição de apresentação de moções de censura. Assiste-se igualmente ao fenómeno curioso da dupla representação na AM, distorcendo a representatividade eleitoral, pois os munícipes elegem diretamente os deputados municipais mas os presidentes de junta também têm assento na assembleia. Infelizmente, em Portugal as AM não podem atuar como verdadeiros parlamentos locais e são completamente subalternizadas, ao contrário das grandes democracias europeias. A legislação autárquica em vigor interessa aos caciques partidários locais, que assim exercem um poder quase absoluto e praticamente não escrutinável na vida local, o que potencializa a corrupção a múltiplos níveis e formas. É um paradoxo falar-se de descentralização sem se democratizar, modernizar e tornar mais transparente, participada e devidamente escrutinada a governação municipal.   13 de Agosto de 2021 A grande arma do ditador é o medo que consegue infligir na população que, por lhe faltar a coragem, aceita sem reclamar tudo aquilo que lhe é imposto. E nós devíamos saber disto. Com tudo o que foi feito para manter vivo o monstro da ditadura - que foi condicionando em quase todas as decisões políticas da vida nacional durante os últimos 47 anos, sempre falando do grande mal da censura e do clima de terror da polícia política - não se compreende como esquecemos que foi a coragem de alguns que permitiu sempre fazer de Portugal um país que serve os seus cidadãos. Ao longo daqueles mesmos 47 anos assistiu-se a uma diminuição da valentia de quem liderava, sempre motivados por ideais de liberdade e de desenvolvimento, tornando esses mesmos valores numa mera moeda de troca para manter o comodismo das vidas. Eis senão quando, chega a pandemia e apanha-nos num momento de marasmo e de torpor que apenas nos permite aceitar comprometer a nossa liberdade, já bastante toldada, para que não fôssemos tão prejudicados pelo vírus com que nos confrontámos. Na verdade, aceitámos de tudo. Desde a ideia de que podemos ficar em casa sem nos preocuparmos com a sobrevivência dos outros, à decisão de matar algumas atividades porque ninguém se querer dar ao trabalho de pensar como poderiam continuar com as condições mínimas que lhes assegurassem qualidade e segurança. Os mesmos partidos que defendem a todo o custo a igualdade das mulheres e que defendem ao êxtase a prevalência da cultura muçulmana sobre a cristã, onde esses valores são inexistentes. Partidos que são a favor do aborto e da eutanásia, mas que se revoltam se alguém tentar matar um animal por estar a sofrer. Partidos que dizem defender a democracia, mas não têm uma palavra para condenar a sua falta em Cuba. Que nos querem impor a ideia de que estamos num país essencialmente racista, quando foi sempre reconhecida a cultura de miscigenação que o país sempre promoveu e que os portugueses sempre praticaram. Partidos e militantes que se reveem em dirigentes que vão à televisão para uma entrevista e que pura e simplesmente se focam em atacar agressivamente o seu entrevistador por ter uma opinião diferente da sua - que será naturalmente a verdade absoluta - como aconteceu com o ministro Pedro Nuno Santos. Atitude de falta de educação que ele próprio reconheceu... Atitudes totalitaristas que nos deixam sempre com a sensação de que a proposta desta esquerda é uma mera destruição de valores, pela exclusiva vontade de ser disruptivo, não sabendo sequer como propor uma nova forma de sociedade. Um verdadeiro fascismo da esquerda que tem o condão de despertar naqueles que nele não se reveem uma vontade de criar o oposto político, que acabará sempre por ser a proposta de uma ditadura da direita. Ser livre é a maior felicidade que temos e o valor mais importante para o nosso desenvolvimento como pessoas.   12 de Julho de 2021 O desconfinamento trouxe mais do que bom tempo. Os partidos têm-se desdobrado em ações e congressos, portanto, iniciativas comuns em ano de eleições. Depois do BE ter realizado a sua Convenção Nacional, e enquanto o PS prepara o seu Congresso, assistiu-se ao MEL, o denominado “congresso das direitas”. (Re)Encontros à parte, fica uma sensação de desconforto quase como se um pequeno elefante permanecesse na sala. No “congresso das direitas” ficou-se a saber que alguns até querem (re)centrar a sua posição. Quiçá talvez devido aos resultados das sondagens sobre o seu abandono do tradicional Centro Democrático Social. Sabendo que o consumo de açúcar sem moderação é nocivo para a saúde, e depois de tanto MEL, lá veio mais um congresso: o da Extrema-Direita. Um forrobodó de concentração de poderes e com direito ao saneamento de um punhado de dirigentes nacionais. E quando as aparências veiculavam uma suposta não interferência noutros órgãos, o resultado final foi: ganharam os mais próximos do “pequeno grande líder”. O PSD tomou uma decisão acertada ao estar ausente no encerramento do congresso de Coimbra. A presença da Liga Norte Italiana não é motivo de orgulho, mas sim de vergonha. Pessoalmente, e como católica, os princípios que norteiam o cristianismo são os da tolerância, respeito pelo próximo e solidariedade. Tudo oposto ao que é apregoado por essa força política italiana e pelo partido que os recebeu. Nesta matéria, a responsabilidade do PSD terá de ir além de comunicados ou ausências em congressos. Os portugueses nunca darão a mão aos extremistas para formarem governo. E assim fica claro: o caminho só poderá ser percorrido com a ajuda dos Sociais Democratas. Daí que a obrigação da direita moderada seja muito mais do que acenar, testar limites ou cambalear ao sabor do vento. É necessária uma posição firme e condizente com os valores que advieram de Abril. Muitos dirão que é uma questão menor, que se controla facilmente ou que nunca terão força suficiente para tomar o poder. Analisem-se as propostas autárquicas a ser apresentadas e os documentos aprovados no Congresso Nacional do Partido e retire-se daí a prova dos nove. Terá Rui Rio coragem, mesmo com custos próprios, para travar uma hipotética tomada de poder pela extrema-direita? O comprometimento será exclusivamente seu. O papel que lhe está destinado é muito mais relevante do que se poderia imaginar: impedir o assalto ao poder pelas forças mais extremistas e desconexas que Portugal já viu. Uma direita oportunista, impreparada, xenófoba, racista, ou seja, só joio e nada de trigo. A escolha acabará por ser aparentemente fácil para Rio: ajudar-se a si ou ajudar Portugal? A responsabilidade é total.   17 de Maio de 2021 Ao considerar a democracia portuguesa como “imperfeita e preciosa”, a propósito do oportuníssimo discurso do Presidente da República na sessão parlamentar comemorativa do 25 de Abril de 1974, Clara Ferreira Alves usou duas palavras apropriadas ao valor insubstituível da liberdade. Mais do que um discurso de circunstância, o Presidente preferiu uma reflexão séria e aprofundada sobre o presente, que não esquece as raízes e se projeta como responsabilidade no futuro. A missão é ingrata, bem o sabemos, já que julgar o passado com olhos de agora seria exigir aos que viveram esse tempo que “pudessem antecipar valores ou o seu entendimento para nós agora tidos por evidentes, intemporais e universais, sobretudo se não adotados nas sociedades mais avançadas de então”... De facto, revisitar a história obriga a muitas precauções - para que não se caia na fácil tentação de “passarmos de um culto acrítico triunfalista exclusivamente glorioso da nossa história para uma demolição global e igualmente acrítica de toda ela”. Importa aprender a olhar, em especial pondo-nos no lugar dos outros. Por exemplo, usar os olhos “que não são os nossos, os do antigo colonizador, mas os olhos dos antigos colonizados, tentando descobrir e compreender, tanto quanto seja possível, como eles nos foram vendo e julgando, e sofrendo, nomeadamente onde e quando as relações se tornaram mais intensas e duradouras e delas pode haver o correspondente e impressivo testemunho”. De facto, não há diálogo se não for possível ir além das atitudes e dos preconceitos de cada um. Importa trocar experiências e usar o sentido crítico como método biunívoco. E há a precaução, porventura mais sensível de todas - a consideração dos vários tempos nas nossas vidas. “aqueles de nós portugueses que têm menos de 50 anos não conheceram o império colonial nem nas lonjuras nem na vivência aqui no centro. O seu juízo é naturalmente menos emocional, menos apaixonado”. Mas devemos distinguir, como salientou o Presidente da República, a posição de “muitos jovens das sociedades que alcançaram a independência contra o império português e viveram depois décadas conturbadas pelos reflexos de vária natureza da anterior situação colonial”. De facto, a história nunca pode ser vista de um só lado. Falamos de fenómenos complexos e diversos, de existências diferenciadas, de interpretações que têm de recusar a simplificação. Ouvimos os ecos da lição de Eduardo Lourenço: “Saído de ilusões (...), povo missionário de um planeta que se missiona sozinho, confinado no modesto canto de onde saímos para ver e saber que há um só mundo, Portugal está agora em situação de se aceitar tal como foi e é, apenas um povo entre os povos. Que deu a volta ao mundo para tomar a medida da sua maravilhosa imperfeição” (Portugal como Destino: Dramaturgia Cultural Portuguesa, 1998). Apenas, um povo entre os povos, nem melhor nem pior do que outros, cuidando da frágil e preciosa flor que é uma democracia de pessoas comuns. “O 25 de Abril foi feito para libertar, sem esquecer nem esconder, mas para libertar, e os que o fizeram souberam superar muitas das suas divisões.” O discurso que temos na memória deve, pois, ser lido e relido. Sobretudo ouvido. “Não há, nunca houve um Portugal perfeito. Como não há, nunca houve, um Portugal condenado. Houve e haverá sempre um só Portugal. Um Portugal que amamos e de que nos orgulhamos para além dos seus claros e escuros, também porque é nosso.”   11 de Março de 2021 Nem bazuca nem vitamina. Para o interior do país o plano de recuperação e resiliência é um estalinho de carnaval e um gomo de tangerina. Um desastre, uma irrelevância, uma injeção pífia. A coesão territorial continua a ser uma gigantesca efabulação e o afunilamento das apostas públicas nas áreas metropolitanas até causa náuseas. O país não está a perceber, não está a ligar, nem está a medir a razia do despovoamento do território, cada vez mais assemelhado a um gigantesco jazigo. Aldeias e vilas inteiras inertes, sem vida nem alma, sem energia nem esperança, são o retrato dramático e cada vez mais inexorável de quase dois terços do nosso pequeno Portugal. Como em quase tudo, há sempre quem não se resigne nem desista, mas também tudo tem limites e eles estão à frente dos nossos olhos vendados. Este era um sopro vital de oxigénio, mas com a teimosia lusitana historicamente fascinada pelo centralismo do Terreiro do Paço, a botija não só não chega a encher-se, como vai esvaziar-se antes de chegar ao destino. Com esta proposta do Governo, os territórios de baixa densidade vão ficar ainda mais para trás. Do pilar da resiliência, o grosso da ajuda europeia com 8,5 mil milhões, sobram umas migalhas para a barragem do Pisão, para o plano hídrico do Algarve e para o cadastro do território, que não se confina especificamente ao interior. Não há um único projeto estruturante que mobilize, que deixe marca ou que catapulte as regiões mais desfavorecidas do país, e devia haver mais que um com o dinheiro que vai jorrar nos próximos anos. O bolo rei voltou a calhar ao litoral e a fava ao interior. Segundo o pensador e autor do plano, Costa e Silva, essa coisa a que se chama coesão territorial é isto e apenas isto: ‘uma área em que Portugal pode pôr o seu papel geopolítico ao serviço da geoeconomia, aproveitando o seu softpower para lutar contra aquilo que é um dos grandes desafios deste século, a luta contra a desertificação, contra a ameaça ambiental’. Perceberam? Talvez não, mas é assim, com erudição e bonitos estrangeirismos, que por cá se tratam problemas bem nacionais. Talvez se aconselhasse um pouco mais de pragmatismo e de menos esoterismo. Não saímos disto, continuamos pobres a optar e a decidir. Este anémico plano para a maior parte do país deveria merecer a mais profunda reflexão nacional. Ao invés, é recebido com um aparente baixar de braços por aqueles que deveriam ser os primeiros a sobressaltar-se e dar um valente murro na mesa. As comunidades intermunicipais tinham aqui um papel muito relevante, mas já só têm seis compridos dias para levantar a sua voz na consulta pública que a Europa obrigou o Governo português a promover. A ideia não era disputarem o mercadinho das obras individuais de cada município, o melhor convite para o Dr. António Costa as meter na gaveta, mas envolverem-se em seletivos investimentos com envergadura regional e nacional que fizessem a diferença e que tivessem verdadeiro poder de atração. Não foi nem será esse o caminho. É pena. Assim o interior leva mais um empurrão rumo a um beco sem saída.

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